Ranking mostra grande distância para cumprimento das metas de saneamento básico



Novo estudo, com base no Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS – base 2018), mostra que avanços são insuficientes para Brasil cumprir compromissos nacionais e internacionais em água tratada, coleta e tratamento dos esgotos.

 

Enquanto o Brasil ainda rediscute a legislação nacional acerca do saneamento básico, os compromissos internacionais assinados pelo próprio país se aproximam da data limite imposta para o cumprimento das metas, sobretudo com o Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU em 2015, em que o Brasil é signatário e se compromete em universalizar o saneamento básico até 2030 para todos. Internamente, o país também tem o compromisso de atingir a universalização proposto pelo Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB) até 2033.

 

No novo Ranking do Saneamento Básico baseado nos 100 maiores municípios do Brasil, em parceria com a GO Associados, os costumeiros indicadores de acesso à água e esgotamento sanitário apontam estagnação no país. Em números gerais, usando o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS – base 2018), ainda 16,38% da população brasileira não tem acesso ao abastecimento de água (quase 35 milhões de pessoas – 3x a população de Portugal); 46,85% não dispõem da cobertura da coleta de esgoto (mais de 100 milhões de pessoas – mais de 2x a população da Argentina). O volume de esgoto no Brasil ainda é um desafio, somente 46% do volume gerado de esgoto no país é tratado.

 

Em ano de eleições municipais, o novo Ranking do Saneamento Básico mostra a responsabilidade dos Prefeitos em fazer avançar os indicadores de água e esgotamento sanitário, sobretudo porque é de responsabilidade do Poder Executivo municipal a titularidade do saneamento. É papel indelegável o planejamento sanitário, a partir da formulação e execução do Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB), sendo obrigatória a participação da sociedade civil. Já nas Regiões Metropolitanas a decisão do STF, desde 2013, é de que as decisões sejam compartilhadas entre os municípios e estado. A responsabilidade sobre os avanços de saneamento básico é de todos.

 

Considerando os 100 maiores municípios brasileiros por número de habitantes, o Ranking contempla mais de 40% da população brasileira e todas as capitais do país. Ao analisar os números desde 2011, é possível concluir que os indicadores avançaram, mas abaixo da velocidade que precisavam.Metodologia do ranking:

 

A metodologia completa do Ranking está disponível no site oficial do Instituto Trata Brasil. Explica os indicadores e as notas dos municípios perfazendo a colocação de cada cidade no ranking.

População com coleta de esgotos nas 100 maiores cidades

 

Os problemas da falta de esgotamento sanitário ainda são latentes no Brasil, sobretudo a coleta e o tratamento dos esgotos. Em 2018, o Brasil inteiro despejou na natureza 5.715 piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento por dia. Por ano, esse número ultrapassa 2 milhões de piscinas olímpicas de esgoto despejadas de forma indevida.

 

O indicador médio de coleta de esgotos nos 100 maiores municípios foi 73,30%, avanço tímido frente aos 72,77% verificados em 2017. No geral, os 100 maiores municípios possuem coleta de esgoto bastante superior à média do Brasil, que foi de 53,2%.Cenário desafiador

 

Os maiores desafios na cobertura de coleta de esgotos ainda permanecem no Norte, seguido do Nordeste. Das 10 piores cidades neste indicador, nove são do Norte ou Nordeste, com destaques para as capitais Belém (PA), Manaus (AM), Macapá (AP) e Porto Velho (RO).Cenário positivo

 

Na contramão, outras cidades apresentam índices praticamente universalizados em relação à porcentagem de população com acesso à coleta de esgoto.Tratamento dos esgotos nas 100 maiores cidades

 

O indicador médio do tratamento de esgotos nos 100 maiores municípios em 2018 foi de 56,07%; pequeno avanço em relação aos 55,61% de 2017. Segundo o SNIS, a média nacional foi de 46,3%, ou seja, as maiores cidades tratam, na média, mais esgotos que a o país. No entanto, em ambos os casos, o indicador está baixo mostrando ser um dos maiores desafios a serem enfrentados.Em contraste com os indicadores de atendimento da população com água tratada e coleta de esgotos, o tratamento dos esgotos, a distribuição das cidades no gráfico mostra uma elevada concentração de cidades cujo tratamento não chega a 20% (19 cidades). 37 cidades tratam menos de 40% dos esgotos e apenas 26 municípios tratam 80% ou mais. O tratamento de esgotos é o que está mais longe da universalização, mesmo nos 100 maiores municípios do país em população.

Cenários mais desafiadores

 

Os baixos indicadores de esgoto tratado no Brasil afetam diretamente os ecossistemas pelo lançamento in natura dos esgotos sem tratamento. Córregos, rios, lagoas e praias têm a qualidade das águas comprometidas com a carga excessiva destes resíduos sem tratamento.cesso à água tratada nas 100 maiores cidades

 

O acesso ao abastecimento de água tratada no Brasil é o que mais avanço historicamente, e mais ainda quando comparado ao esgotamento sanitário (coleta e tratamento de esgotos). O indicador médio nos 100 maiores municípios em 2018 foi de 93,31% da população; um retrocesso frente a 94,60% em 2017. A média desses maiores municípios é, portanto, superior à média brasileira que foi de 83,6%.Perdas de água potável nas 100 maiores cidades Índice de Perdas na Distribuição (IPD)

 

As perdas de água servem para medir não somente os volumes ou recursos financeiros perdidos com vazamentos, fraudes, roubos, erros de medição, mas também para se ver os níveis de eficiência dos serviços de saneamento básico nos municípios.

 

O indicador médio de perdas nas 100 maiores cidades foi de 34,40%, o que representa uma melhoria frente os 39,50% de 2017. Tal valor também é inferior à média nacional no SNIS 2018, que foi de 38,5%. Os pontos de máximo e mínimo correspondem, respectivamente às cidades de Porto Velho – RO (77,11%) e Santos – SP (14,32%).Dos 100 municípios considerados, apenas três possuem níveis de perdas na distribuição menores que 15% (valor considerado ótimo). Mais de 75% das cidades têm perdas superiores a 30%, o que mostra um grande potencial para melhorias.

Cenário mais desafiadorÍndice de Perdas de Faturamento Total (IPFT)

 

O IPFT é constantemente usado no Ranking para mostrar as perdas de faturamento totais, considerando perdas físicas e comerciais, na comparação entre o volume produzido e o volume faturado. O indicador médio em 2018 foi de 37,60%, um avanço frente os 43,14% observados em 2017. O município com menor índice de perdas de faturamento foi Petrópolis (0,91%) e o com maior, é Boa Vista – RR (73,32%).Dez cidades relataram, em 2018, perdas financeiras totais maiores ou iguais a 60%, o que é muito elevado para qualquer sistema no mundo. 41 cidades reportaram mais de 45% de perdas e apenas nove cidades possuem níveis de perdas de faturamento total iguais ou menores que 15% (valor usado como parâmetro ideal). Quase 70% das maiores cidades têm perdas de faturamento superior a 30%, o que mostra haver um grande potencial para redução das perdas financeiras nesses municípios e isso permitiria ter mais recursos para ampliar as redes de água e esgotos, bem como para investir nas próprias perdas.

Cenário mais desafiadorÍndice de investimentos sobre a arrecadação nas 100 maiores cidades do Brasil

 

Para este estudo, adotou-se como critério avaliar a média dos investimentos sobre receita dos últimos cinco anos. A metodologia considera não apenas os investimentos realizados pela prestadora, mas também os investimentos realizados pelo poder público (Município e Estado). Quanto maior for essa razão (investimento/arrecadação), mais investimentos o município está realizando relativamente à arrecadação, logo, merece uma melhor posição no Ranking.

 

O indicador médio dos municípios equivale a 21,45%, ou seja, essa percentagem da arrecadação foi reinvestida nos sistemas de saneamento. O valor foi inferior ao observado em 2017 (22,28%), e menor ainda do que em 2016 (23,19%).

 

Uma vez que este indicador avalia os esforços dos municípios para a universalização dos serviços e que os investimentos em saneamento costumam ser maiores no período anterior à universalização, definiu-se que um município com serviços universalizados e com bons indicadores de perdas também receberia nota máxima neste indicador, independentemente da relação entre investimentos e arrecadação.

 

Assim, para o que o município receba nota máxima, independentemente de sua relação investimentos sobre arrecadação, deverão ser obedecidas as seguintes regras:

 

Universalização em água;

 

Água Total = 100%

Água Urbana = 100%

 

Universalização de coleta de esgoto;

 

Coleta Total ≥ 98%

Coleta Urbana ≥ 98%

 

Universalização de tratamento de esgoto;

 

Tratamento de esgoto ≥ 80%

 

Baixo nível de Perdas

 

Perdas na distribuição de água ≤ 25%

Perdas de faturamento ≤ 25%

 

Obtiveram nota máxima por esse critério os municípios de Franca (SP), Santos (SP) e Maringá (PR).

 

No caso do Brasil, é notável que os investimentos atualmente realizados estão abaixo da necessidade para a universalização dos serviços. De acordo com dados do PLANSAB, o investimento para alcançar a universalização até 2033 deveria estar em torno de R$ 24 bilhões ao ano, sendo que ao longo dos últimos anos, os valores efetivamente investidos ficaram em torno de metade do necessário (R$ 12 bilhões). Na prática, boa parte das companhias de saneamento possui baixa capacidade de endividamento e, consequentemente, de realizar investimentos. Assim, a consequência é a demora no avanço em direção a universalização.Observa-se que 70% dos municípios investe menos de 30% do valor arrecadado; além disso, existe a presença de alguns outliers (6), que investem mais de 60% da receita.Destaques

 

Investimento anual médio por habitante: para que se possa ter uma base de comparação foi feita uma avaliação a partir dos dados do Plansab – Plano Nacional de Saneamento Básico, revisado em 2019 sobre os investimentos necessários para a universalização dos serviços. De acordo com o Plansab, a necessidade de investimentos no Brasil em água e esgoto no período 2019 – 2033 é de R$ 357,150 bilhões, ou R$ 23,8 bilhões ao ano por um período de 15 anos. Considerando a atual população do Brasil de acordo com a base do SNIS (208 milhões de habitantes), pode-se estimar uma necessidade de investimento anual médio por habitante para o Brasil no período 2019 – 2033 de R$ 114 por habitante por ano. Assim, podemos comparar o grupo das 20 piores cidades e das 20 melhores da seguinte forma:

 

As 20 melhores cidades tiveram um investimento anual médio por habitante no período 2014 – 2018 de R$ 133, ou 17% acima do patamar nacional médio para a universalização (R$ 114).

Já as 20 piores cidades tiveram um investimento anual médio por habitante no período 2014 – 2018 de R$29,95, ou 74% abaixo do patamar nacional médio para a universalização (R$ 114).

 

Fica claro que o grupo das 20 melhores cidades investe valores compatíveis para universalizar os serviços, tendo em vista os parâmetros do PLANSAB. Já o grupo das piores cidades tem indicadores ruins de atendimento e um investimento médio anual por habitante muito abaixo do necessário para a universalização.

 

Observa-se que esse maior volume de investimento se reflete em melhores indicadores: no caso dos 20 melhores, o indicador médio de atendimento de água é 99,30%, ou seja, 21,88 pontos percentuais superior ao grupo dos 20 piores municípios (77,42%).

 

Em relação à coleta de esgotos, nas 20 melhores cidades 96,74% do esgoto é coletado contra apenas 26,61% nas piores. Uma diferença de 70,13 pontos percentuais. No caso do tratamento dos esgotos, as 20 melhores tratam, em média, 77,19% do esgoto gerado contra apenas 14,99% nas piores; uma diferença de 62,2 pontos percentuais.

 

Já em perdas de água têm-se que o grupo dos 20 melhores municípios apresenta nível de perdas de faturamento (31,09%), bem menor que os piores (53,94%). Uma diferença de 22,84. Nas perdas na distribuição a diferença é de 17,58 pontos percentuais.

 

Confira todos os gráficos e dados aqui.

26-03-2020