Análise dos Impactos do Coronavírus no setor ambiental



Em 2020 o mundo foi surpreendido pelo avanço da COVID-19, causada pelo coronavírus (SAR-CoV-2), e o forte impacto trazido pela doença na saúde e economia de todas as nações.

 

A possibilidade do surgimento de um novo surto de coronavírus do tipo SARS ou MERS na China foi alertado um ano antes pelo Wuhan Institute of Virology, através da publicação do artigo Bat Coronaviruses in China, mas apesar da previsão da disseminação da doença, não houve qualquer moção do país ou do mundo diante a essa probabilidade.

 

Frente ao despreparo e imperícia das instituições governamentais para com o enfrentamento a pandemia, foram criados às pressas protocolos médicos e de isolamento social, a fim de desafogar os limitados leitos de UTI, que logo se esgotariam com pacientes que manifestam a forma mais severa da patologia (sistema pulmonar acometido), com isso, tais protocolos contribuem para o “achatamento da curva” epidemiológica da doença, evitando assim, o colapso dos sistemas de saúde.

Histórico legislativo para adoção do protocolo de medidas de isolamento social no Brasil

 

Seguindo a adoção do estado de emergência global em razão da disseminação do coronavírus no dia 30 de janeiro pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil declarou em 03 de fevereiro o estado de Emergência em Saúde Pública de importância Nacional através da Portaria Nº 188, regulamentando em seguida as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública por meio da lei Nº 13.979/20 , medidas essas, que permitiram que autoridades adotassem protocolos de isolamento social e quarentena em território nacional.

 

Com o objetivo de delinear o formato do protocolo de isolamento social, instituiu o governo federal a intermédio do decreto Nº 10.282/20 a criação de um rol de serviços públicos e atividades consideradas essenciais, no qual inicialmente, estavam presentes as atividades exercidas pelo setor de saneamento básico, que recentemente sofreu um revés com a revogação das atividades de captação, tratamento e distribuição de água, esgoto e lixo do rol de atividades consideradas essenciais pelo governo federal através do decreto Nº 10.329/20, ficando tal regulação a critério de estados e municípios.Reflexos da exclusão do saneamento básico do rol de atividades essenciais

 

A retirada dos serviços de saneamento é vista por especialistas como prejudicial para as companhias e para a população, pois essa medida traz consequências diretas na operacionalização e relevância dessa atividade. Os reflexos dessa exclusão ficam visíveis em medidas adotadas por alguns estados, que suspenderam o pagamento de contas da utilização de serviços de água e esgoto a partir de dezembro ou por vezes implementaram moratórias equivalentes a três ou quatro meses, prejudicando o caixa e por conseguinte a qualidade dos serviços prestados pelas concessionárias.

 

Atualmente o marco regulatório do Saneamento tramita no senado e está em fase de ajustes finais. Das alterações previstas, uma envolve a Agência Nacional de Águas (ANA), que abarcará em suas competências a regulação do saneamento básico, o que na opinião de especialistas fará com que a ANA preste auxílio aos estados e municípios no tocante as diretrizes de implementação de políticas de água, esgoto e resíduos sólidos. Outro ponto que atualmente enfrenta dificuldades e que se espera ter auxilio do marco é a sustentabilidade econômica dos serviços de saneamento, ou seja, a cobrança de taxa por meio do poder público ou tarifa pelo privado, ponto tido como fundamental para a sustentabilidade dos negócios de infraestrutura.

Fortalecimento do setor energético

 

Apesar do revés no saneamento, atividades do setor energético se fortaleceram em meio a pandemia, com decisões tomadas pelo STF, a exemplo da declaração de inconstitucionalidade do artigo 279 da constituição do mato grosso pela ADI 6350, que condicionava a construção de centrais termoelétricas e hidroelétricas a aprovação da assembleia legislativa, bem como a inconstitucionalidade da edição do artigo 2º da lei do estado de MG nº 12.503/97 que impunha às concessionárias de geração de energia elétrica o uso de parte de suas receitas para investimentos em preservação de mananciais hídricos.

Impacto no Setor minerário

 

O setor minerário, inicialmente suprimido do rol de atividades consideradas essenciais, foi posteriormente incluído no que compreende as atividades de lavra, beneficiamento, produção, comercialização, escoamento e suprimento de bens minerais. No período em que a atividade ainda não havia sido inclusa no rol taxativo supramencionado, houve em vários estados da federação a sinalização de promotores favoráveis a diminuição/suspensão das atividades do setor, o que com a posterior inclusão, não se verificou.

 

Como ressaltado por diversos operadores do direito, apesar do estado de calamidade decretado pelo governo federal, atividades como a fiscalização de empreendimentos não podem ser interrompidas, ainda que haja dificuldade, muitos entendem que há de ser realizado um trabalho de contenção e sopesamento de riscos por parte do estado, e que observados os direitos do indivíduo, é dever dele promover um protocolo de minimização de riscos para que a atividade não deixe de ser exercida.

 

A Agência Nacional de Mineração (ANM) tem conjecturado discussões para a adoção de medidas de concessão de direitos minerários, independentemente da obtenção do licenciamento ambiental dos empreendimentos. Tal fomentação tem sido criticada por parte dos especialistas em direito ambiental, pois apesar da ANM tratar dos direitos minerários em si, não é ela responsável pela viabilidade socioambiental do empreendimento, de maneira que a concessão desse direito é condicionada, sendo assim, no entendimento desses especialistas, além de não possuir caráter de urgência, levar a leilão uma determinada atividade, sem que a sua viabilidade, portanto a licitude do objeto, esteja caracterizada, traz consigo riscos para a administração pública: do não perfazimento do objeto de uma necessidade; para o cidadão: com assunção de risco desconhecido, além do risco para o interessado na concessão.

 

Especialistas contrários as tratativas da AMN traçam uma analogia entre o fomento da concessão de direitos minerários e os leilões iniciais de energia, realizados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) poucos anos após sua criação, onde também não solicitavam como requisito obrigatório a licença prévia do empreendimento, que apresentou as mesmas inseguranças e riscos apontados na situação atual.

 

Em contraponto, parte da categoria jurídica expressa opinião favorável ao debate da AMN, alegando que as diversas autorizações necessárias para realização de qualquer atividade seguem tempos diferentes de emissão, visto que são procedimentos distintos, e o vinculo entre a necessidade da licença ambiental para obtenção da concessão dos direitos minerários não representa necessariamente uma maior proteção ao meio ambiente. Isto posto, o fato da agência outorgar um direito minerário não autoriza ninguém a ingressar na atividade sem a licença ambiental sendo ela necessária, sob pena de crime, como consta no Art. 55 e 60 da lei Nº 9.605/98.

 

Segundo os defensores da medida, é fundamental que se entenda que exercer a atividade que depende de licenciamento ambiental, na forma do Art. 10 da lei Nº 6.938/81 e Art. 2º da lei complementar Nº 140/11 sem licença é crime, sendo esta, já uma garantia da condução adequada dos procedimentos caso a agência decida por liberar e desvincular a necessidade de apresentação das licenças ao longo do processo como condição essencial para o avanço do processo mineral.

Processo de licenciamento ambiental e cumprimento de obrigações ambientais

 

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) em seu comunicado Nº 7337671/20, apresentou um conjunto de diretrizes temporárias relacionadas ao cumprimento das obrigações legais, referentes às medidas de tratamento e compensação dos impactos ambientais pré-existentes ao estado restritivo provocado pela pandemia.

 

Dentre as diretrizes, o cumprimento das obrigações legais perante o licenciamento ambiental deve ser mantido, na medida do possível, tanto quanto as medidas ligadas de forma imediata e direta a níveis adequados de qualidade ambiental. A autarquia ressalta também que se o cumprimento de alguma medida ou obrigação ambiental não for operacionalmente possível, a empresa deverá agir para minimizar os efeitos e a duração desta não conformidade.

 

Em suma, apesar da paralisação de diversos setores, as atividades do segmento ambiental, tidas como fundamentais para o combate à pandemia, aprecem no radar dos governos, órgãos e entidades da administração pública através do debate de medidas de vão desde a realização de serviços de coleta e tratamento de resíduos até a fiscalização e cumprimento de obrigações ambientais pré-existentes em todo território nacional. Espera-se que com o fim da pandemia, não cessem os desdobramentos jurídicos oriundos de um momento tão delicado vivido por toda sociedade.

Pedro Carvalho Oliveira.

22-05-2020