Enquanto o Brasil só tem olhos para a lista de políticos citados nas delações da Odebrecht, o setor ambiental do Brasil tem sofrido constantes ataques e retrocessos. Um deles veio a rebote do anúncio do Governo federal, há duas semanas, de um corte de R$ 58,2 bilhões nos gastos discricionários, ou seja, não obrigatórios, em seu orçamento, para atingir a meta fiscal deficitária de quase R$ 143 bilhões. O já combalido Ministério do Meio Ambiente (MMA) arcou com a assustadora redução de 53% do seu orçamento previsto, o que significa vê-lo despencar de R$ 964 milhões para R$ 446 milhões.
Considerando que o Ministério do Meio Ambiente já contava com apenas com 0,18% do orçamento da União, na prática, a Fazenda acabou buscando água num pote já quase seco. Os R$ 465 milhões economizados no MMA não fazem nem cócegas no problema fiscal, já que representa menos de 0,5% da meta projetada pelo governo.
Por outro lado, esse corte no orçamento, somado à pouquíssima atenção que a esfera central do Executivo dá à pasta, pode gerar impactos extremamente negativos para o clima e, por consequência, para a imagem e a economia do Brasil.
O MMA nunca contou com uma participação orçamentária avantajada. A média anual de 2009 para cá foi de meros 0,23% do orçamento da União. Com o corte sofrido, o orçamento do órgão cai para pífios 0,09% do total.
Nesse cenário, como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis, lançados no Brasil no encontro Rio+20, serão cumpridos? De onde sairão recursos para conter o novo pico de destruição da Amazônia e o desmatamento irregular no cerrado e nos demais biomas? Como o Brasil cumprirá seus compromissos de combate às mudanças climáticas, anunciados na Conferência de Paris, em 2015?
O mundo está de olho na retomada da derrubada da floresta amazônica. Sem recursos, é provável que a destruição de um dos maiores patrimônios dos brasileiros continue subindo, e a reputação do Brasil nesta área se esvaindo como fumaça.
Não controlar a derrubada da floresta ainda pode representar prejuízos à produção agrícola do país. A floresta atua como um sistema regional de irrigação gigante da agricultura, que fornece clima estável e chuva para o atual motor da economia brasileira. Sem floresta, não existirá agricultura pujante e mais difícil será a retomada do crescimento econômico no longo prazo.
Manter a engrenagem de preservação ambiental rodando é fundamental para o país. Essa área não suporta mais perder seus já insuficientes recursos, sob o risco de todos sofrerem com graves consequências do descuido num futuro próximo.
Contudo, a decisão tomada na semana passada e a análise do Orçamento dedicado à pasta nos últimos anos mostram o contrário. Todos os setores da sociedade brasileira, inclusive aqueles presentes em Brasília, precisam abandonar a visão que preservação ambiental é custo, não investimento. O corte orçamentário do MMA é mais do que um vexame para o país. Implicará num agravamento das já vexatórias taxas de destruição da Amazônia, do cerrado, da mata atlântica, do Pantanal, da caatinga, dos pampas. É beber gulosamente o último gole de água num deserto, sem pensar no longo caminho que ainda precisa percorrer.
FONTE: www.elpais.com/brasil
03-05-2017