Lodo na agricultura, seus riscos e benefícios



O emprego do lodo oriundo do tratamento de efluentes na agricultura ainda é controverso, produzindo opiniões contrastantes entre diversos especialistas do setor

 

Com intuito de fechar a cadeia produtiva das estações de tratamento de efluentes, pesquisadores Brasileiros buscam alternativas cada vez mais seguras e eficientes para a erradicação da problemática enfrentada pelas estações, que contam com um gradativo aumento na geração de lodo e consequente maior necessidade de disposição deste resíduo. Atualmente, este material rico em matéria orgânica e outros elementos essenciais para o crescimento vegetal, tem como principal destino, os aterros sanitários.

 

Apesar de promissora, a aplicação de excretas humanas na agricultura não é novidade, surgindo na china antiga com registros do provérbio “Treasure nightsoil as if it were gold” (Valorizar as excretas como se fossem ouro). Ao trazer essa aplicação para a atualidade o pesquisador Thomas Gamper Feitoza em sua tese de mestrado realizada no Centro de Energia Nuclear na Agricultura – CENA/USP sobre os Patógenos humanos em solo cultivado com eucalipto e tratado com lodo de esgoto classe B: risco, sobrevivência e recrescimento, buscou apontar dados sobre a toxicidade e o risco de aplicação desta técnica.

 

Disposto como sexto item dos objetivos globais para o desenvolvimento sustentável da ONU, a água limpa e o saneamento estão intimamente ligados ao abastecimento de água e produção de esgoto, tal-qualmente seu tratamento e disposição final do lodo produzido. Ao contextualizar este objetivo ao atual cenário Brasileiro, que conta com apenas 25% do esgoto coletado e tratado em todo território nacional, observa-se uma demanda ainda reprimida, que ao longo do tempo em se atingindo o pleno atendimento, necessitará de medidas legais mais permissivas com relação ao uso deste subproduto.

 

O fósforo fertilizante utilizado na agricultura não-conservacionista é obtido através da mineração, mais precisamente de rochas fosfáticas, tendo como ponto crítico o atual estado de esgotamento das Jazidas deste mineral; estimativas mais pessimistas estipulam o esgotamento deste recurso em até 80 anos, já as otimistas estipulam um prazo de até 300 anos, ambas colapsam com o anseio de sobrevivência de toda espécie humana.

 

O fósforo é essencial para o cultivo de plantas alimentícias, fibrosas e na agricultura como um todo, encontrando-se presente em quantidade limitada nos solos tropicais. Dado este contexto, a reciclagem deste mineral dos lodos torna-se importante, não só por sua quantidade, mas também pela forma em que está presente: Um fósforo orgânico, interagindo com a microbiota e que possui melhor disponibilidade para as plantas do que os adubos fosfatados industrializados provenientes de rochas de mineração.

 

Águas residuais tratadas em uma estação de tratamento de efluentes localizada ao leste da província de Cairo foram bombeadas para os plantios florestais locais. As espécies que mais se adaptaram ao regime proporcionado foram: Khaya Senegalensis e o E. Camaldulensis; Tal ação proporcionou o Incremento médio anual (IMA), – índice que mede o crescimento médio da floresta até uma determinada idade -, de 12 m³ por hectare por ano para essas espécies, valor muito inferior se comparado ao crescimento do Eucalipto em território brasileiro, que chega à valores de 50 m³, entretanto, levando-se em conta o crescimento das plantas diretamente em terreno arenoso, nutrindo-se apenas da água residual aplicada, o estudo apresenta um resultado excelente.

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Localização da ETE, plantação das mudas e resultado.

 

Afim de apresentar as regiões com melhor aptidão da terra para o emprego de lodo na bacia PCJ, Urban e Isaac adotaram alguns critérios e os aplicaram na elaboração de um mapa ilustrativo, que definia o potencial do uso de determinada região para o recebimento de lodo como fertilizante. Os critérios utilizados para essa definição seguiram a seguinte ordem: Profundidade; Textura superficial; Suscetibilidade a erosão; Relevo; Hidromorfismo; Área de conservação; Reservatórios; Cursos d’água; Vulnerabilidade de aquíferos e Áreas urbanas.

 

Bacia PCJ: Mapa de aptidão da terra para uso do lodo.

 

As regiões com potencial alto e moderado de aplicação de lodo foram separadas em um mapa, com o acréscimo da legenda que definia o uso do solo em cada microrregião destacada.

 

Bacia PCJ: Áreas com potencial alto e moderado para aplicação de lodo.

 

Com o mapa acima, pôde-se observar que a maior área destacada se destina ao cultivo de cana de açúcar, cultura essa, passível do recebimento de lodo, e que as 61 estações de tratamento que forneceriam o lodo necessário para a fertilização dessas terras estão pulverizadas em todo mapa, minimizando a dificuldade logística.

 

11,33% da área da Bacia PCJ é considerada apta a auferir o lodo proveniente das estações anteriormente mencionadas, sendo que, todo este território possui capacidade de receber 2,6 mi t ST ano -1 . Esta capacidade de suporte de recebimento é considerada muito maior que a atual geração de lodo, dado isto, conclui-se que para a bacia PCJ, todo lodo não contaminado com metais produzido nas 61 estações poderia ser utilizado em todo território agrícola com maior aptidão.

 

Uso do solo e capacidade de recepção do uso

Incertezas e riscos

 

Apesar da capacidade total de recepção e utilização do lodo produzido nas estações localizadas na bacia PCJ em seu entorno como fertilizante agrícola, as restrições impostas pela Resolução CONAMA nº 375/2006 freiam uma possível utilização indiscriminada deste composto, pois como é previsto na seção 2, artigo 11, tabela 2 e 3, existem concentrações máximas estabelecidas para metais pesados e patógenos no lodo, limitando assim seu emprego na agricultura.

 

As restrições são completamente compreensíveis, pois os metais quando em contato com o solo se ligam fortemente aos coloides e matéria orgânica presente, com posterior difícil extração e possíveis danos à toda cadeia trófica.

 

 

Concentrações máximas permitidas para o uso do lodo na agricultura (CONAMA nº 375/2006).

Patógenos e tipos de lodo

 

Ao serem abordados no tópico presente na seção 2, artigo 11, tabela 3 da resolução CONAMA nº 375/2006, os patógenos classificam o lodo em duas categorias: A e B, sendo o lodo classe B mais contaminado com organismos patogênicos, dado isto, tem seu uso agrícola vetado desde 2011, pendendo novas pesquisas para alteração deste veto.

Emprego do lodo Classe B na Silvicultura – Patógenos humanos em solo cultivado com eucalipto e tratado com lodo de esgoto classe B

 

A silvicultura (ciência que se ocupa das atividades ligadas a implantação e regeneração de florestas) possui setores economicamente ativos e em expansão, como por exemplo o setor de Papel e Celulose: Amplamente voltado ao cultivo de culturas não alimentícias e com alto grau de mecanização, cenário ideal para aplicação e análise do uso do lodo classe B, pois as rotas de contaminação por ingestão podem ser ignoradas neste caso.

 

Afim de investigar o recrescimento de patógenos no solo, o pesquisador Thomas Gamper testou a hipótese de que quando o lodo classe B é aplicado no solo, há decaimento da população de organismos patogênicos e que o recrescimento de Salmonella, quando identificado, é proveniente de contaminação externa ao lodo original aplicado. Para tal, os objetivos empregados consistiram em:

 

Avaliar a presença, persistência e decaimento de organismos patogênicos (coliformes termotolerantes, Salmonella, ovos viáveis de helmintos e vírus entéricos) no solo aplicado com lodo de esgoto classe B;

 

Realizar a sorotipagem de cepas de Salmonella isoladas ao longo do experimento e avaliar similaridades genéticas com os sorotipos do lodo inicialmente aplicado;

 

Construir uma análise de risco microbiológico simplificada para as atividades realizadas no eucaliptal após e durante a aplicação do lodo como fertilizante.

 

Aplicação e resultados

 

A aplicação do lodo foi realizada do mesmo modo à de um fertilizante tradicional, porém, condicionando o trabalho ao pior cenário possível, com um lodo vindo da ETE sem passar pelo período de maturação/estabilização, em uma dose alta e de maneira superficial. Esta técnica não seria utilizada em um cenário cotidiano, pois costuma-se revolver o material para promover maior contato entre o fertilizante e o solo.

 

Foram realizadas aplicações em dois ambientes distintos: No campo aberto e outro em casa de vegetação (protegida das intemperes), pois no caso de uma contaminação ambiental (recrescimento), seria possível analisar sua origem.

veja os gráficos e imagens

30-08-2017