O governo Jair Bolsonaro pretende dar uma “repaginada” na proposta da MP do saneamento básico.



A ideia é apresentar uma versão própria do texto que reforma a legislação do setor e está em tramitação no Congresso Nacional. Um encontro com executivos das companhias de água e esgoto, parlamentares e potenciais investidores deve ocorrer no fim deste mês ou início de março para a divulgação do conjunto de mudanças.

 

Uma medida provisória foi reeditada na última semana de Michel Temer com a caneta presidencial, mediante o consentimento da equipe de transição, que reconheceu a necessidade de tratar o assunto com urgência. Agora, o Ministério do Desenvolvimento Regional prepara ajustes no texto que saiu do Palácio do Planalto em 27 de dezembro.

 

O prazo para emendas à MP 868 terminou na segunda-feira à noite. Deputados e senadores entregaram 477 propostas de alteração – número considerado bastante elevado e que reflete as controvérsias em torno do tema.

MP do saneamento

 

Logo no início do ano, paralelamente à tramitação legislativa, o ministério quis abrir um canal de diálogo com interessados e recebeu sugestões de aperfeiçoamentos à MP. Essa coleta de contribuições durou até meados da semana passada. Agora, a Secretaria de Saneamento Ambiental trabalha em um texto que será encaminhado para o futuro relator como possível substitutivo.

 

“Mantivemos uma interlocução ampla com todo o setor”, afirma o secretário Jônathas de Castro. Ele garante que três linhas-mestras continuarão orientando o novo marco legal: abertura à iniciativa privada, segurança jurídica e estabilidade regulatória. “Não vamos tomar partido nem do mercado público, nem do mercado privado, mas do que for melhor para políticas públicas de saneamento.”

 

A presidência da comissão mista responsável pelas discussões da medida provisória caberá a um deputado e a relatoria a um senador, conforme o rodízio das Casas. Os nomes serão definidos somente após a escolha das lideranças do governo no Senado e no Congresso. E o ministério prefere ter um relator já nomeado para apresentar o novo texto.

 

Enquanto isso, há pressão de todos os interessados. O deputado Samuel Moreira (SP) e o senador Izalci Lucas (DF), ambos do PSDB, protocolaram emendas pedindo a retirada do artigo 10-C – provavelmente o trecho mais polêmica da medida provisória.

Obras e serviços de saneamento

 

Esse ponto obriga as prefeituras a fazer chamamentos públicos para contratar obras e serviços de saneamento, estimulando a concorrência no setor. Antes, os municípios podiam fazer contratação direta com companhias públicas. Na semana passada, o vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (DEM), defendeu uma mudança na MP. Da forma atual, segundo ele, a Sabesp perderá competitividade e o governo seria praticamente forçado a privatizar a empresa. Ele prefere a capitalização.

 

“O que defendemos abertamente é que tenha uma emenda na medida provisória do saneamento excetuando as estatais não dependentes do Tesouro [da perda de preferência]. Com isso, a Sabesp poderia continuar competitiva e, a partir daí, o projeto de capitalização”, disse Garcia.Uma carta entregue ao governo por quatro associações vai na mesma linha. “Se mantido, o dispositivo permitirá que a iniciativa privada dispute com as companhias públicas apenas os municípios superavitários. Com isso, as companhias públicas poderão perder o equilíbrio financeiro e serão obrigadas a atender os municípios mais problemáticos, o que limitará a capacidade de investimento do setor público e levará ao sucateamento dos serviços”, afirmam a Abar (associação das agências reguladoras), Abes (engenharia ambiental), Aesbe (empresas estaduais de saneamento) e Assemae (municipais).

 

Outros pontos defendidos pelas entidades são a ampliação de tarifas sociais para consumidores de baixa renda e a desoneração de PIS/Cofins, segundo o presidente da Abar, Fernando Franco.

Projetos

 

Para o engenheiro Carlos Eduardo Castro, diretor do grupo privado Águas do Brasil, que detém 13 concessões espalhadas pela região Sudeste, a abertura de chamamentos públicos pelas prefeituras ou consórcios municipais é “extremamente relevante” para impulsionar investimentos no setor. Ele contraria o argumento das associações de que as empresas privadas ficarão de olho só no “filé” e deixarão o “osso” de lado.

 

“Estamos interessados em bons projetos, isso sim. Mais de 72% dos serviços de saneamento operados pela iniciativa privada estão em municípios com menos de 50 mil habitantes”, rebate o executivo. Castro prefere ver a questão de outra forma. Hoje as estatais têm uma vantagem em cidades menores, mas não oferecem soluções atrativas. Resultado: 104 milhões de brasileiros não têm esgoto tratado. “É ingenuidade imaginar que vamos mudar tal cenário se essas questões não forem atacadas”, afirma.

 

Desde 2007, segundo informações do governo federal, 160 contratos de Estados e municípios para obras e serviços foram cancelados. Esses projetos receberiam R$ 3,5 bilhões do Orçamento Geral da União (OGU), em repasses só do extinto Ministério das Cidades, a fundo perdido. “Os Estados e as concessionárias públicas não conseguiram executar os empreendimentos previstos, basicamente obras de saneamento ou elaboração de projetos executivos de engenharia”, afirma trecho da exposição de motivos da MP 868.

Fonte: AESBE

14-02-2019