No dia 14 de novembro, a Abes-MG promoveu em sua Sede uma mesa redonda sobre o destino dos Resíduos dos Serviços de Saúde (RSS) gerados em Belo Horizonte. A vice-presidente da entidade, Pegge Sayonara, deu as boas vindas aos mais de 50 participantes presentes e convidou os palestrantes a compor a mesa para expor a atual situação e as perspectivas da destinação final desses resíduos.
A mediadora e conselheira da Abes-MG, Maeli Estrela Borges, ressaltou a importância e a urgência de se debater o assunto, uma vez que, o prazo final estabelecido pela Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) para encerrar as atividades de coleta, transporte e descarte dos RSS termina no dia 16 de novembro de 2014. “A Abes-MG está atenta à necessidade de adequação a essa nova realidade, por essa razão reunimos aqui hoje os principais atores envolvidos (geradores, órgão regulador e ofertante dos serviços) para discutir a situação”, disse.
A assessora técnica da diretoria de gestão de resíduos da Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam), Alice Libânia Santana Dias, fez a primeira apresentação e falou sobre a legislação vigente no país e no Estado para a regulação dos RSS. “Em geral, a gestão dos resíduos é uma questão que está em voga devido as demandas da sociedade, e a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) vem ganhado espaço na tentativa de mediar os conflitos existentes”, ressaltou.
Alice Libânia destacou que a PNRS encube os municípios da gestão integrada dos resíduos gerados em seu território. Em Minas Gerais, todo o sistema de transporte, tratamento ou disposição final dos resíduos passa por regularização ambiental. Nesse processo, estão incluídos o licenciamento e as autorizações ambientais de funcionamento, que apesar de precárias em alguns casos, são a forma de regularização no Estado. Assim, os sistemas de tratamento dos resíduos dos serviços de saúde são passiveis de licenciamento e as regras e códigos específicos estão previstos na Resolução Conama 171/2004. “É importante frisar que todos os agentes envolvidos na gestão dos RSS têm suas responsabilidades no atendimento ao que está disposto nas normas legais”.
Ainda segundo ela, as Superintendências Regionais de Regularização Ambiental (Suprams) são as responsáveis pela regularização e o licenciamento ambiental, cabendo à Feam apoiar as ações com estudos, proposição de atos normativos e termos de referência. “A Feam foca em estudos setoriais, programas, projetos de pesquisa, ações de fomento a educação e, no âmbito dos serviços de saúde, no controle das declarações dos empreendimentos que estão sujeitos a prestar informações, relativas à DN 171. Ambas são responsáveis pela fiscalização, monitoramento e orientação como um todo”, concluiu.
Já a responsável técnica pela implantação do projeto de gerenciamento de resíduos do Complexo Hospitalar das Clínicas da UFMG, Elci de Souza Santos, destacou que para gerenciar os RSS é preciso ter olhos e garras de águia para enfrentar os desafios apresentados e tentar resolvê-los. “Esse é um trabalho que depende de muitos atores e do processo constante de sensibilização das pessoas, dentro da instituição, para que sejam colaboradores.”
Elci lembrou que o Hospital das Clinicas é um dos maiores prestadores de serviços de saúde de Minas Gerais e referência no tratamento de patologias de media e alta complexidade. “Devido ao tamanho da instituição, fazemos a pesagem dos resíduos por amostragem. Essa pesagem é feita durante quatro meses no ano, separando os resíduos por grupos e sub-grupos, de acordo as instruções da SLU. Durante sete dias, pesamos cada tipo de resíduo e fazemos uma projeção mensal. Esse processo tem sido utilizado a mais de sete anos e validado nossos contratos, que preveem uma variação de no máximo 25% para mais ou para menos. Já validamos essa metodologia como uma amostra confiável. Atualmente geramos cerca de 72 toneladas de resíduos por mês, desse total, 62 toneladas são de resíduos A4, D e E”, explicou.
Ela conta que houve um aumento de quase duas toneladas no quantitativo de resíduos porque, a Anvisa na contramão do Conama, determinou o descarte de vários materiais que poderiam ser reaproveitados. Por outro lado, ela explica que diminuir o volume de resíduos na área de saúde é uma utopia, o que precisa ser feito é um bom trabalho de gerenciamento. Segundo ela, o volume de resíduo químico gira em torno de uma tonelada e meia por mês. Os resíduos de alto risco são autoclavados e encaminhados para o tratamento e descarte adequado e, o grande gargalo, é o resíduo que não precisa ser tratado e que, a partir de agora, deixará de ser coletado pela SLU.
Quanto a rotina de coletas e custos, ela explicou que os resíduos A4, D e E são coletados diariamente pela SLU em dois caminhões compactadores e a disposição final feita em aterro sanitário a um custo que gira em torno de 30 mil reais por mês. Os resíduos do grupo B são acondicionados em bombonas lacradas e coletados quinzenalmente por empresas especializadas, seguindo para incineração e disposição final em aterro sanitário classe I e II, ao custo de 3.200 reais o quilo. E, as lâmpadas fluorescentes e multivapores, são coletadas por uma empresa especializada a um custo de 6 mil reais ano. “A partir da saída da SLU teremos mudanças no processo de coleta”.
Entre as dificuldades, Elci citou que todos os resíduos passarão a ser acondicionados em bombonas lacradas, e que isso aumentará o número de coletas, já que o volume que sai hoje, de uma só vez, passará a sair em pelo menos quatro viagens, aumentando os custos. Além disso, existe a possibilidade da BHTrans não ser permitir o trânsito de caminhões na região hospitalar durante o dia, o que pode culminar no aumento das coletas no período noturno, implicando na criação de novos turnos de trabalho, novos processos de fiscalização e rotinas dentro da instituição.
“Também temos a preocupação com o aumento de caminhões carregados de resíduos transitando longas distâncias em rodovias movimentadas, afinal os incineradores mais próximos de Belo Horizonte estão em Contagem e em Lagoa Santa. Como corresponsáveis a nossa preocupação com acidentes é muito grande. Outra preocupação é com as empresas prestadoras de serviços que não tem capacidade para receber esse volume hoje e que precisarão fazer investimentos em curto prazo para atender a essa nova rotina”.
Outro problema são os atrasos na liberação de licenças pelos órgãos públicos, e que pode desqualificar as empresas no processo de contratação dos serviços. Além disso, a competitividade dos prestadores também tem se mostrado um desafio, pois as tecnologias diferenciadas, com custos diferentes no mercado, tem dificultado a definição das regras para o edital de contratação. “Esbarramos no curto prazo para elaboração e lançamento do edital de contratação, que hoje dentro da universidade gira em torno de 180 dias para ser finalizado. Apesar do regime de emergência, o edital que está em andamento, depende de alguns ajustes por conta dessas modalidades. E depois, não sabemos quanto tempo ele ficará na procuradoria jurídica”, contou.
“Também temos outro problema, que ainda não está instalado, mas temos que pensar antes que se instale, que são as demandas emergentes como no caso do ebola. Estamos construindo um plano de contingência, no Brasil inteiro para receber algum possível caso da doença e precisamos cuidar para que, caso ocorra, não se espalhe. No entanto, a questão do descarte dos resíduos ainda não está definida, muito menos quem vai assumir os custos com a geração extra desse resíduo”, finalizou.
Em seguida, o Superintendente da SLU, Vitor Valverde, contou que assumiu a autarquia, há 90 dias, e nesse período, ao realizar um diagnóstico das atividades, se deparou com o problema da destinação dos resíduos dos serviços de saúde. “Esses resíduos vinham sendo depositados em uma célula específica no aterro de Macaúbas, localizado às margens da BR-040. No entanto, a vida útil dessa célula se esgotou e não há outra alternativa a não ser encerrar a destinação para esse local. Tomei essa decisão amparado por estudos técnicos e unanimidade desses profissionais. Durante uma reunião com os membros da COPAGRESS, anunciei que a decisão não poderia mais ser postergada. Estudei as alternativas existentes, visitei empresas de autoclave, aterros próximos a Belo Horizonte, fui em loco visitar a célula que está prestes a se esgotar e fiz o levantamento das alternativas possíveis. Depois disso, iniciei o processo de comunicação aos atuais clientes da SLU. Atualmente 280 estabelecimentos de saúde, dos quais metade é a própria prefeitura. Atendi a todas as pessoas que me procuraram para tratar do assunto. Realizei várias reuniões, depois publiquei o ofício e o ato no Diário do Município. Comuniquei ao nosso secretário municipal de saúde e estamos auxiliando na construção do edital para a contratação dos serviços. Entendendo as demandas, e por isso mesmo, estabelecemos prazos diferenciados para as instituições publicas e privadas. Além disso, recentemente estendemos esse prazo por mais 15 dias”, explicou.
Vitor Valverde destacou que a grande questão do encerramento desse serviço não é econômica, mas sim ambiental e de segurança da saúde pública. “Considero que a presença da SLU na prestação desse serviço desregulou o mercado e desincentivou o surgimentos de alternativas mais competitivas e ambientalmente mais adequadas. Nossa presença fez mal a esse cenário ao oferecer um preço irreal, e um serviço público que não é adequado”, completou.
O Superintendente disse ainda que não considera correto o uso do tributo pago pelos cidadãos para subsidiar a coleta de materiais de hospitais privados e públicos. Ele destacou que a única inconveniência dessa decisão é o prazo, mas que o problema já deveria ter sido enfrentado antes. “Não temos mais prazo na célula, e a decisão certa agora é essa, embora o certo signifique desagradar muita gente”.
Valverde finalizou contando que, recentemente, alguns hospitais entraram na justiça contra a decisão da SLU de encerrar a prestação do serviço. Ele disse que se sentiu satisfeito com as decisões dos juízes de negar qualquer liminar nesse sentido. “Cito o Doutor Renato, que não conheço, mas que de forma bastante consistente, embasou sua decisão negativa em 20 páginas onde aborda toda a normatização federal, estadual e municipal sobre o assunto e finaliza dizendo que a reclamação se deve única e exclusivamente ao fato do custo econômico ser maior do que o praticado pela SLU”, concluiu.
Para finalizar, a especialista em resíduos, Maeli Estrela Borges, citou um trabalho realizado por ela na SLU, com 33 planos de gerenciamento, dos quais 9 de entidades filantrópicas, 9 de hospitais públicos e 15 de particulares, onde foi implantada a coleta diferenciada para os resíduos do grupo D. “Chegamos a conclusão que 22,85% dos resíduos são do grupo A, sendo a maior parte do grupo A4, que pode ir para o aterro sem tratamento prévio. 1,15% dos resíduos é do grupo B e precisa ser tratado, outros 70,18% são resíduos do grupo D, que é resíduo comum e apenas 4,82% são do grupo E, classificados como perfurocortante. Isso significa que se houver, na origem, a segregação correta haverá um aumento significativo de resíduos do grupo D que poderão ser destinados a aterros convencionais”, detalhou.
Maeli afirmou ainda, que se os hospitais atendidos pela SLU tivessem realizado essa segregação corretamente a vida útil da vala de resíduos dos serviços de saúde teria sido prolongada por muito mais tempo. “Acreditamos que com a saída da SLU a segregação passará a ser feita e haverá uma redução de pelo menos 75% no volume gerado hoje na capital”, concluiu.
17-11-2014